Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Trabalho em plataformas digitais no Brasil segue marcado por exploração e precariedade, aponta pesquisa 

06 outubro, 2025
08:26
Por Jéssica Tokarski
Ciência e Tecnologia

Relatório Fairwork Brasil 2025 revela salários baixos, ausência de direitos e endividamento entre trabalhadores de aplicativos 

O relatório Fairwork Brasil 2025, produzido por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) em parceria com outras instituições, apontou a precariedade das condições enfrentadas por trabalhadores de plataformas digitais de entrega, transporte e serviços sob demanda.  

O estudo destacou exploração, salários baixos e ausência de direitos básicos como os principais problemas, avaliados a partir de cinco princípios do “trabalho decente”: remuneração, condições de trabalho, contratos, gestão e representação. 

Realizado entre agosto de 2023 e agosto de 2025, o levantamento avaliou empresas de diferentes setores: Uber, 99 e InDrive (transporte de passageiros); iFood, AmeFlash, Lalamove, Loggi e Rappi (entrega de mercadorias); Superprof (aulas particulares); e Parafuzo (serviços de faxina doméstica).” 

Avaliação 

O Fairwork avalia as condições de trabalho em plataformas digitais e atribui pontuação conforme o desempenho. Os cinco princípios mínimos de “trabalho decente” foram definidos com a participação de diferentes partes interessadas na Organização Internacional do Trabalho (OIT). 

Remuneração justa: exige que os trabalhadores recebam remuneração adequada em seu local de origem, considerando os custos do trabalho. Os ganhos são avaliados com base no salário mínimo vigente na jurisdição e no período analisado. 

Condições justas: prevê que as plataformas adotem políticas de proteção contra riscos do processo de trabalho e medidas proativas para garantir saúde e segurança dos trabalhadores. 

Contratos justos: os termos e condições devem ser claros, acessíveis e compreensíveis, vinculados à legislação local e com identificação da parte contratante. Não podem conter cláusulas que excluam injustamente a responsabilidade da plataforma ou do usuário. 

Gestão justa: requer processos documentados que permitam aos trabalhadores serem ouvidos, recorrer de decisões que os afetam e receber justificativas. Deve existir ainda um canal de comunicação claro. 

Representação justa: estabelece que os trabalhadores possam expressar sua voz por meio de processos documentados, organizar-se coletivamente e negociar com as plataformas, que devem estar dispostas a cooperar. 

Imagem: Reprodução Fairwork 2025

Os dados foram coletados por meio de pesquisa documental, entrevistas com trabalhadores e reuniões com representantes das empresas. 

Cada princípio é dividido em dois pontos, atribuídos apenas quando a plataforma comprova sua implementação. A ausência de pontuação não significa necessariamente descumprimento, mas sim falta de evidência.  

O segundo ponto só é concedido após o cumprimento do primeiro e a pontuação máxima de cada plataforma pode chegar a dez pontos. 

Resultados 

As únicas plataformas que receberam pontuação foram InDrive e Superprof, na categoria “Remuneração justa”, por garantirem aos trabalhadores pelo menos um salário mínimo após os custos do trabalho. 

Nos demais critérios, nenhuma empresa pontuou e várias não apresentaram evidências de conformidade, o que reforça a vulnerabilidade dos trabalhadores frente à falta de responsabilidade das plataformas. 

As evidências mostraram falhas nos sistemas de remuneração, ausência de equipamentos de segurança sem custo para os trabalhadores, falta de canais humanos para resolução de problemas e obstáculos à organização coletiva. 

Imagem: Reprodução Fairwork 2025

De acordo com Maria Aparecida Bridi, professora do Departamento de Sociologia da UFPR e integrante do estudo, a persistência da precariedade, observada desde o relatório inicial de 2022, chamou atenção. 

“As pessoas trabalham longas jornadas, recebem pouco e assumem todos os riscos. Outro ponto alarmante é o endividamento: os trabalhadores são donos dos instrumentos de trabalho como bicicleta, carro, computador e celular. As empresas lucram não apenas explorando uma força de trabalho desprovida de direitos, mas também pela financeirização, já que muitas criaram bancos e oferecem empréstimos aos próprios trabalhadores”, explica. 

A pesquisadora destaca que esses fatores evidenciam a ausência de condições adequadas para o bem-estar dos trabalhadores. “Não há evidência concreta de que sejam autônomos: a suposta autonomia é apenas formal e não se reflete nas relações de trabalho”, afirma.   

Caminhos para mudança 

O relatório adota a teoria da mudança do Fairwork, que aposta no poder da empatia e do conhecimento. As classificações permitem aos consumidores escolher plataformas com melhor desempenho, pressionando empresas a melhorar as condições de trabalho. 

Para Maria Aparecida, é fundamental assegurar direitos trabalhistas básicos, como férias, repouso semanal remunerado e previdência social. “A alternativa é regulamentar esse trabalho sem reduzir direitos já reconhecidos a outras categorias”, afirma. 

Relatório Fairwork 

O Fairwork é um projeto internacional feito em parceria com o Oxford Internet Institute (Universidade de Oxford) e com o WZB Berlin Social Center, por meio da agência de cooperação Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ), e reúne pesquisadores de instituições de referência. 

No Brasil, a pesquisa envolveu, além da UFPR, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade de Brasília (UnB). 

Sugestões

06 outubro, 2025

Pesquisa do Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFPR aponta que a motivação para compartilhar notícias falsas perpassa […]

06 outubro, 2025

Quinta reportagem da série que explica, com o auxílio de seus professores, o conceito de soberania nacional, em […]

03 outubro, 2025

Espaço é uma iniciativa conjunta entre a UFPR e o Governo do Paraná  Na última quinta-feira (02), foi […]

02 outubro, 2025

Estudantes de graduação poderão ministrar oficinas e receber bolsas; comunidade também pode participar de modo voluntário. Inscrições até […]