Logo UFPR

UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARANÁ

Rita de Cássia dos Anjos: representatividade que chega às galáxias

Professora Rita é astrofísica, professora e pesquisadora da UFPR (Foto: @luprezia/Divulgação)

Antonia sempre foi uma mulher curiosa, de abrir objetos que estragavam para ver como consertar. Também tinha um quê de vanguarda: mãe de oito filhos numa cidade do interior de São Paulo, aconselhou-os sobre os estudos e deu a deixa para formar uma grande cientista em casa: “não aceite as coisas como elas são”, dizia para Rita de Cássia dos Anjos, professora do departamento de Engenharia e Exatas do Setor Palotina e uma das vencedoras do prêmio “Programa Para Mulheres na Ciência 2020”, promovido pela L’Oréal Brasil, Unesco Brasil e Academia Brasileira de Ciências. 

Rita não aceitou e, hoje, é uma das estrelas do livro de passatempos “Cientistas Negras: Brasileiras – Volume 1” , representando uma área muito associada à cultura masculina: as ciências exatas. Seu objeto de estudo são as galáxias Starburst, investigadas como possíveis fontes de raios cósmicos de altas energias, mas o interesse pela Astrofísica começou a ser identificado após a graduação em Física Biológica, na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp). No mestrado, estudou Teorias de Campos Integráveis e Sólitons. No doutorado, propagação de raios cósmicos extragaláticos, ambos na Universidade de São Paulo (USP) – e foi para Harvard, a mais prestigiada universidade dos Estados Unidos, como bolsista da Capes. 

A cientista alcançou grande visibilidade em 2020 por conta do prêmio em que se candidatou pela terceira vez e que vai lhe ajudar a comprar um equipamento de ponta e a remunerar uma bolsista por um ano. Todas as vencedoras são mulheres, mas só ela e mais uma são negras. E é aí que a formação acadêmica de Rita e sua biografia começam a ganhar um contorno crítico – meninas e mulheres negras precisam de exemplos para realizarem seus sonhos. 

A desigualdade destrói o sonho de qualquer mulher negra. É preciso que a gente dê grandes passos em ações e políticas públicas para minimizar esse problema. As ações afirmativas precisam potencializar o ingresso das meninas negras na universidade, mas também dar suporte à sua permanência e ao ingresso no mercado de trabalho”, comenta a professora, que revela estar estudando cada vez mais o assunto. 

A questão da representatividade também lhe toca. Rita conta que sua maior inspiração foi a própria mãe, curiosa e inventiva com uma espécie de “ciência do dia a dia”. Nos laboratórios, entretanto, formou-se vendo e admirando o trabalho de homens brancos. “Não tive referências de cientistas negras mulheres. Para isso, precisamos muito de projetos inclusivos“. 

Rita “para colorir”, no livro Cientistas Negras, do projeto Meninas e Mulheres nas Ciências

Esses projetos começaram a pipocar na mesa de Rita, que está engajada em contribuir com meninas e mulheres negras que sonham com uma carreira acadêmica. A ideia é mostrar que existe um caminho. “Recentemente, fiz um material para apresentar alguns caminhos e oportunidades, como bolsas e intercâmbios. Projetos são muito importantes, mas é mais importante ainda exigir seu funcionamento – as cotas nós vemos, mas e o depois?”. Ela lembra que apenas 10% das mulheres negras não evadem dos cursos e que essa estatística aumenta ainda mais as desigualdades. “Muitas vezes elas precisam abrir mão de um emprego e conseguir uma bolsa que não ajudam a mantê-las na universidade”, pontua. 

E para aqueles que a usarem como algum exemplo de meritocracia, Rita tem respostas que também evocam seu seio familiar. A mãe estimulou que ela e os sete irmãos estudassem. Nem sempre é uma história típica – ou poucas vezes é. A desigualdade também gera famílias desestruturadas, em que esse apoio e esse exemplo podem ser raros. “Ela é visionária e até hoje me provoca a buscar as coisas. Por estímulo dela estou só agora fazendo o cursinho do Detran”, brinca. “Há muitas famílias desestruturas, sem esse exemplo. Ela me ensinou a ser forte”. 

Passados três meses da conquista do prêmio “Mulheres na Ciência”, dividindo o tempo em entre entrevistas, lives, eventos acadêmicos e leituras e projetos para aumentar a participação de meninas e mulheres negras na ciência, Rita também chegou a novas descobertas científicas. Em dois artigos (aqui e aqui) assinados com grupos de pesquisadores ao redor do mundo, assegura a precisão do espectro de raios cósmicos de alta energia, com dados obtidos desde 2004. A colaboração envolve cientistas do mundo todo: Argentina, Eslovênia, México, França.  R. C. dos Anjos” está lá, encarando as galáxias como um objeto e tantos outros desafios como uma cientista, mulher, negra.

 “A pesquisa me deu essa oportunidade, mas os negros e negras ainda estão na base da pirâmide. Por isso, quando os poucos chegam nessa posição onde estou, é importante que trabalhem em projetos inclusivos, que ajudem a passar a mensagem: olhem, vocês podem chegar onde eu cheguei‘”. 

 

Sugestões

Centro de Medicina Veterinária do Coletivo comemora segundo aniversário com ação de adoção de cães
O Centro de Medicina Veterinária do Coletivo (CMVC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) comemora...
Pesquisadores relatam primeira evidência de poluição por biomídias plásticas no litoral do Paraná
As biomídias plásticas (termo usado pela indústria de saneamento) são pequenas peças plásticas perfuradas...
A revista AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento passa a integrar o Scimago Journal Rank
A revista AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento é o periódico científico interdisciplinar...
Ações de divulgação científica da UFPR são apresentadas em encontro internacional na Espanha
As atividades de divulgação científica da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foram apresentadas, esta...