O projeto nasceu da experiência de Fábio Cordeiro, servidor da UFPR há mais de 20 anos, pessoa autista e pai de autista, com o objetivo de promover um atendimento mais inclusivo e humanizado
O Complexo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná UFPR (CHC-UFPR), vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), lançou o projeto “Instituição Amiga da Pessoa Autista”, com foco na inclusão e humanização do atendimento hospitalar. A iniciativa visa preparar os profissionais de saúde para oferecer cuidados mais empáticos, respeitando as particularidades dos indivíduos no espectro autista.
Fábio Cordeiro conta que a motivação surgiu das dificuldades enfrentadas nos serviços de saúde, tanto como usuário quanto como profissional da área.
“O que me motivou foi tanto a experiência pessoal quanto a profissional. Como pessoa autista e pai de autista, já passei por situações em que os profissionais não sabiam lidar com as características do autismo. E como profissional, eu também via isso acontecer. Percebia o despreparo das equipes, não por falta de vontade, mas por falta de treinamento”, explica Fábio Cordeiro, presidente da ONDA-AutismoS e servidor do CHC.
Capacitação para transformação no atendimento
O projeto teve início com a capacitação intensiva das equipes do CHC-UFPR, com foco na compreensão do autismo, para além dos estigmas e estereótipos. Durante o treinamento, os profissionais aprenderam sobre o funcionamento do autismo, direitos legais e práticas de acolhimento, desde consultas e exames até internamentos mais longos.
“Trabalhamos tanto a parte conceitual quanto a parte legal e prática. Queremos que o profissional entenda o autismo de verdade, para que ele mesmo possa criar estratégias de atendimento inclusivas. O autismo ainda é muito desconhecido, e o pouco que se conhece é baseado em mitos. Esse treinamento tenta quebrar isso”, explica Fábio.
Agora, os profissionais têm mais segurança para atender e compreender os pacientes autistas, o que resulta em um atendimento mais acolhedor e eficaz.
“No HC já trabalhamos com atendimento humanizado. Mas ele precisa ser para todos. Não podemos justificar um exame mal feito dizendo que o paciente autista não conseguiu realizá-lo. Se eu não souber como atender esse paciente, foi a equipe que falhou. Isso precisa mudar”, afirma Fábio.
O projeto contou com a colaboração da ONG Onda-AutismoS, que atua na promoção de direitos e inclusão de pessoas autistas. A instituição ajudou na formação das equipes e no desenvolvimento das abordagens adotadas no projeto.
Impacto que vai além do hospital
Como hospital universitário de referência, o CHC-UFPR tem um papel importante na formação de profissionais e na disseminação de boas práticas na saúde pública. O projeto “Instituição Amiga da Pessoa Autista” já inspira outros serviços de saúde.
“O HC é referência em várias áreas e pode ser também na inclusão. Já fomos procurados por outros serviços para replicar essa iniciativa. Isso mostra que o impacto vai além dos muros do hospital”, destaca Fábio.
Segundo ele, a conscientização sobre o autismo precisa ultrapassar os limites da comunidade autista: “Nós, que somos da comunidade autista, falamos muito sobre autismo dentro da nossa bolha. O difícil é furar essa bolha e falar com a sociedade em geral. Quando treinamos um profissional que nunca teve contato com uma pessoa autista, aquilo muda não só a vida profissional dele, mas também a pessoal. Isso é inclusão social.”
Desafios e obstáculos no atendimento
Fábio também chama a atenção para as dificuldades enfrentadas pelas famílias de pessoas autistas, desde o diagnóstico, que ainda é caro e de difícil acesso, até a falta de preparo dos ambientes públicos e privados. Para ele, o maior obstáculo no atendimento é o desconhecimento.
“A maior dificuldade dos profissionais é não conhecer o autismo. Ou conhecer de forma muito superficial, pelo senso comum. Esse projeto vem para desmistificar, para trazer informações de qualidade e transformar essa realidade”, diz Fábio.
Ele conclui: “A pessoa autista precisa ser bem atendida em qualquer lugar – seja numa consulta, emergência ou internação. É isso que buscamos: um atendimento de qualidade para todos.”
Carteira de identificação da pessoa com Transtorno do Espectro Autista
Rogério de Fraga, gerente de Ensino e Pesquisa do CHC-UFPR, destaca a importância da carteira de identificação para pessoas autistas. “A carteira de identificação da pessoa com transtorno do espectro autista já existe no Brasil. Sua emissão é respaldada pela legislação federal e estadual e tem validade nacional. Ela pode ser emitida acessando os portais da Secretaria de Cidadania, o que garante sua validade em todo o território nacional”, explica Rogério.
Rogério vê o projeto como um agente de mudanças importantes no hospital. “A longo prazo, vejo esse projeto como um grande catalisador de transformações institucionais. Para os profissionais, representa uma oportunidade de desenvolver competências socioemocionais e ampliar o repertório técnico, criando um ambiente de trabalho mais empático. Para as famílias, o impacto é a garantia de um acesso a um serviço de saúde que respeita as especificidades do autismo, o que reduz o sofrimento e aumenta a confiança na instituição”, afirma Rogério.
Ele também observa que semear uma nova cultura de cuidado é fundamental: “Quando o atendimento não é acolhedor, existe um sentimento de que as pessoas não são compreendidas. Semear uma cultura de escuta valoriza a neurodiversidade e resulta em um respeito maior.”
A capacitação como vetor de mudança
Rogério também afirma que a capacitação voltada ao atendimento de pessoas autistas é um dos maiores vetores de transformação institucional. “Essa sensibilização envolve desde recepcionistas até enfermeiros, psicólogos e gestores. Não é apenas um curso, mas uma mudança de mentalidade. Quando os saberes sobre o autismo são incorporados às rotinas de trabalho, o hospital passa a atender com mais atenção à singularidade dessas pessoas. Isso fortalece o hospital, alinhado aos princípios do SUS, e posiciona o CHC como uma referência nacional no acolhimento humanizado”, destaca.
Ele ainda observa a relevância dessa capacitação: “O número de diagnósticos de transtorno do espectro autista tem aumentado, assim como a procura por serviços preparados para esse público. Em um momento em que a inclusão e a acessibilidade estão no centro do debate público, é fundamental que nossos profissionais estejam preparados para os desafios de um futuro mais inclusivo.”
O futuro da saúde pública
Rogério acredita que iniciativas como essa ajudam a resgatar o propósito original da saúde pública. “Os hospitais universitários são espaços formadores e consolidador de valores. Quando investimos em ações educativas como essa, não estamos apenas melhorando o atendimento de hoje, mas formando uma geração de profissionais mais conscientes de seu papel social. O ambiente hospitalar mais empático é também mais eficiente, seguro e respeitoso para todos.”
Ele finaliza: “Investir em ações educativas é garantir que nossos profissionais estejam preparados para os desafios e, acima de tudo, comprometidos com a construção de um futuro mais inclusivo.”
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