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Ideias econômicas influenciaram desenvolvimento de Brasil e Argentina, aponta pesquisa em Ciência Política da UFPR

Pesquisador Renato Perissinotto analisou a interferência de elites estatais e políticas para a industrialização dos países

Antes dos anos 1930, a Argentina era mais poderosa economicamente que o Brasil. Mas, quando os dois países entraram em um processo de industrialização, o cenário se inverteu. Como aconteceu essa mudança é o que o professor Renato Perissinotto, do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), busca responder em seu novo livro “Ideias, burocracia e industrialização na Argentina e no Brasil”, lançado recentemente nos dois países estudados pela editora Lenguaje Claro.

De acordo com o pesquisador, o que impulsionou o desenvolvimento do Brasil foram forças ideológicas e políticas atreladas a uma “elite desenvolvimentista”, que estava interessada na industrialização. A partir desse grupo, foram criados aparelhos do Estado para promover políticas industriais, instituindo no país o que Renato chama de “Estado desenvolvimentista”.

Pesquisa mostra que desenvolvimento do Brasil foi impulsionado por forças ideológicas e políticas atreladas a uma “elite desenvolvimentista”. Foto: Deborath Ramos via Unsplash/Divulgação

Muitos dos órgãos criados entre 1930 e 1980 ainda existem, como a Petrobrás, a Eletrobrás, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco do Brasil. Na Argentina, que sempre teve tendências mais liberais, essa elite não se articulou para criar a burocracia (os aparelhos do Estado) necessária para a industrialização.

O que Renato prova em sua pesquisa é que as ideias foram capazes de mobilizar o desenvolvimento dessas nações. “É claro que essas ideias não produzem efeitos simplesmente por serem ideias. Elas precisam encontrar agentes e promover coalizões sociais e políticas que reúnam poder suficiente para que se concretizem. As ideias das elites brasileiras formam coalizões que viabilizam a construção de instituições voltadas à industrialização de forma mais intensa do que as organizações argentinas”, explica.

A obra é resultado de dez anos de pesquisas, realizadas na UFPR e também na Universidade de Oxford, na Inglaterra. Em sete capítulos, Renato realiza a análise histórica dos dois países em seus períodos de industrialização e compara as características que apresentaram neste processo. A última parte do livro traz uma comparação mais ampla, com mais sete países, em que se comprovam os resultados obtidos pela observação anterior.

Expandindo a comparação

O método utilizado pelo pesquisador é conhecido entre os cientistas sociais como “análise comparativa-qualitativa”, baseada em documentos do período histórico visado para controlar as variáveis de estudo. “Não se fazem experimentos em geral nas Ciências Sociais, porque é algo muito difícil, então nós controlamos variáveis comparando”, expõe Wellington Nunes, que foi aluno de Renato no mestrado, doutorado e pós-doutorado e divide com ele a autoria do oitavo capítulo do livro.

Capa do livro de Renato Perissinotto, professor da UFPR. Imagem: Renato Perissinotto/Arquivo Pessoal

Existem duas variáveis no trabalho do professor: a industrialização (resultado) e a presença de uma elite modernizadora e um Estado desenvolvimentista (condições causais). Para conferir se a relação entre elas era válida, Renato e Wellington analisaram outros países que se industrializaram tardiamente – após o fim da Segunda Guerra, em 1945 – assim como Brasil e Argentina. Foram escolhidos Japão, Coréia e Tawain, mais industrializados, Zaire (atual República Democrática do Congo), Nigéria e Filipinas, menos desenvolvidos, e a Índia, com situação similar à da América Latina.

Através da comparação, os pesquisadores conseguiram provar a validade do argumento de Renato. “Confirmamos que, de fato, a presença de uma elite modernizadora, comprometida com um projeto de desenvolvimento com base na industrialização, é uma condição necessária para a industrialização tardia. Assim como o processo de construção institucional, ou seja, o desenvolvimento de instituições desenvolvimentistas pelo Estado”, afirma Wellington.

O Brasil hoje

A análise de Renato se estendeu de 1930 a 1965, quando a ideologia desenvolvimentista esteve em alta no Brasil. Segundo ele, a partir dos anos 1980, o país passou por um processo de revisão profunda dessa ideia, já que o desenvolvimentismo foi sendo paulatinamente abandonado porque “não funcionaria mais” na era da globalização.

“Hoje, passamos por um processo de aprofundamento de um pensamento liberal, de retirada plena do Estado da intervenção econômica e defesa de uma sociedade baseada no livre mercado. Embora esse tipo de coisa tenha muitas ambiguidades, sobretudo no Brasil”, ressalta o professor.

Tanto Renato quanto Wellington percebem atualmente a existência de uma tentativa de desarticular as instituições que possibilitaram o desenvolvimento do país no século 20. Para os cientistas, há um subaproveitamento dos órgãos estatais como o BNDES e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os quais poderiam contribuir para a construção de um projeto nacional a longo prazo.

De acordo com Renato, o problema vai além: pessoas capacitadas para pensar esse plano nacional. “Não é necessariamente ter um plano acabado, mas ter um norte e tentar criar condições políticas e institucionais para se alcançá-lo. Mas quem é capaz de fazer algo similar no Brasil hoje em dia? Onde estão as pessoas que queiram pensar o Brasil não só até a próxima eleição?”, questiona.

Nesse sentido, Wellington reforça que a população deve ficar atenta ao discurso das autoridades, sobretudo na hora de escolher o seu voto – uma vez que as visões políticas orientam os rumos do país. “Tudo depende das ideias que os políticos, os atores de governo, sobretudo no Executivo, ostentam, e qual a capacidade que eles têm de colocar essas ideias em prática”.

Confira mais detalhes sobre a carreira acadêmica do professor Renato no mais recente episódio do Fala, Cientista Perfil

Por Isabela Stanga
Sob supervisão de Chirlei Kohls
Parceria Superintendência de Comunicação e Marketing (Sucom) e Agência Escola de Comunicação Pública da UFPR

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