O traço colorido da forma geométrica do toro, desenhado em folha branca, podem até lembrar que um dia ela flertou com a Arquitetura. Mas também demonstram aquilo que, aos 27 anos, Aline Zanardini se tornou: uma pesquisadora encantada com a Geometria. Sua trajetória marcante pela graduação e pelo Mestrado em Matemática na UFPR a transformaram numa cientista de destaque – hoje ela cursa doutorado, com bolsa, na Universidade da Pensilvania, nos Estados Unidos, e foi escolhida como destaque e promessa intelectual na sua área de atuação.
No final de julho, ela foi palestrante do Women in Algebraic Geometry, do Instituto de Pesquisa Computacional e Experimental em Matemática, que reuniu pesquisadoras em evidência no mundo todo na área de Geometria Algébrica. Sua participação foi registrada no site do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), um dos mais importantes do Brasil. “Me sinto muito grata por ser mulher, brasileira e matemática e por ter tido tantas oportunidades”, comenta.
Aline é orientada, nos Estados Unidos, pela professora Antonella Grassi, a quem qualifica como muito importante na sua trajetória, pois “além de ser uma matemática fantástica é uma líder ativa em promover mulheres na matemática”. Mas todo o percurso, que envolve uma mudança precoce do interior (Pato Branco) para a capital (Curitiba) antes de se tornar uma investigadora promissora é celebrado por ela com carinho, especialmente no que se refere ao papel dos professores e professoras que encontrou na UFPR.
“Toda essa mudança, aos 17 anos, com a minha irmã, de 15, foi uma experiência e tanto. Eu não sabia o que ia encontrar na faculdade, pois escolhi a Matemática no último ano do Ensino Médio”, relembra ela, que também foi medalhista da Olimpíada Brasileira. Como gostava de desenhar, Aline pensava que Arquitetura seria uma opção, mas bastou o primeiro semestre no Processo Seletivo Estendido do Departamento para começar a construir uma certeza: aquela matemática que lhe era apresentada a estimulava.
“Era uma matemática muito diferente daquela que eu conhecia da escola. Ela me apresentava descoberta de possibilidades, de áreas, de conceitos e estruturas que eu não tinha ideia que existiam”, comenta. Naquele momento, ela também começava a chamar a atenção dos professores.
“Sempre muito dedicada e talentosa, era impossível não se impressionar com a maturidade que ela demonstrava desde o início. Sua capacidade de trabalho era muito, muito acima da média de qualquer aluno de graduação”, comenta o professor José Carlos Eidam, do Departamento de Matemática.
Tanta maturidade a impulsionou cedo para os caminhos da iniciação científica e, logo em seguida, do mestrado. “Se você gosta e entra em contato com algo novo, você vai querer aprender mais e saber mais. Aí é os professores que você encontra pelo caminho que farão toda diferença”. Filha de professor de Matemática, Aline destaca a importância de todos aqueles que cruzaram seu caminho na UFPR. Desde os que encontrou em sala de aula, até os orientadores das pesquisas e do Programa de Iniciação Científica e Mestrado, o PICME. “Foi uma formação bastante sólida, desde o início, com muitas atividades, seminários de pesquisas, seminários de pós-graduação”.
Vida no exterior e promessa da Matemática
Foi também por conta do estímulo dos professores e professoras do departamento e da pós-graduação que Aline decidiu continuar sua carreira acadêmica no exterior. No início, achava que não era para ela, pois tinha que investir na formação em inglês e nos processos de aplicação, todos com um custo alto. Mas decidiu fazer cursos e se preparar para mais um desafio.
A pesquisadora selecionou as universidades em que gostaria de trabalhar pensando naquelas que se destacavam na Geometria Diferencial ou Geometria Complexa. Também aproveitou a interlocução com os professores da UFPR, que indicaram nomes de possíveis orientadores. Aline aplicou para três universidades diferentes e, já em 2016, mesmo ano em que terminou o mestrado, era bolsista na Universidade da Pensilvânia, uma das mais tradicionais dos Estados Unidos.
Mesmo com uma adaptação difícil, por conta da saudade do Brasil e das diferenças com relação ao ensino, Aline abraçou os desafios. Desde o início, foi professora assistente, dando aulas de exercícios e corrigindo trabalhos dos alunos da graduação. No final do primeiro ano, sua pesquisa também passou por uma guinada para a Geometria Algébrica e para o estudo das fibrações elípticas.
Atualmente, seu interesse é entender a geometria dos toros, o que envolve uma média de oito horas diárias de concentração, na base do papel e da caneta. Alguns cálculos precisam do auxílio do computador, mas seu trabalho mais basilar é uma mescla de desenhos, com contas, somados ao processo de escrita da tese, que está na sua fase final. “Depois, tenho o objetivo de me candidatar a algum pós-doc. A ideia é continuar mais um tempo no exterior para fortalecer os contatos e construir novas colaborações”.
Modesta com suas conquistas, quase dez anos depois do ingresso na UFPR, a pesquisadora é também reconhecida como destaque nos Estados Unidos. Este ano, foi nominada no Dean Scholar 2020, homenagem concedida anualmente a alunos da Universidade da Pensilvânia que exibem desempenho acadêmico excepcional e são considerados promessa intelectual. Uma de suas professoras, Julia Hartmann, disse que as conquistas dela nesta área “ultrapassaram o que é típico de uma estudante em seu estágio em nosso programa”.
“A maior parte do meu trabalho envolve ler muito, aprender o que já foi feito e aprender as ferramentas que preciso”, explica. Mas ela reconhece que a dedicação e o zelo aos desafios também são parte de uma trajetória destacada como exemplar. “Eu tive muitas oportunidades desde que nasci, ter nascido onde nasci e estudado onde estudei é parte disso“.
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