Ex-integrante da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a bióloga e socióloga Magda Zanoni lançou na noite da última terça-feira (19) em Curitiba o livro ‘Transgênicos para quem?’.
Organizado por ela em parceria com o pesquisador francês Gilles Ferment, o livro reúne 33 artigos, de autores europeus e brasileiros. A obra foi editada pelo Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (Nead), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
‘Esse livro é uma resposta de pesquisadores dentro de uma comissão antidemocrática’, resumiu Magda Zanoni, que foi pesquisadora do Nead e atuou na CTNBio como representante do MDA. ‘Lá [na comissão] era proibido falar sobre terminologias de áreas que não fossem relacionadas à genética e à biologia celular.’
Segundo a organizadora do livro, 18 dos 27 membros originais da CTNBio já tinham uma posição prévia favorável aos transgênicos. ‘O que se passou lá dentro foi uma vergonha nacional, não tivemos o direito à crítica.’
Em Curitiba, o lançamento do livro ‘Transgênicos para quem?’ aconteceu no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFPR. Outras cidades brasileiras também irão sediar lançamentos regionais. Na França, a publicação foi lançada no último mês de março, na Assembleia Nacional, em Paris.
O público-alvo da publicação são pesquisadores, professores, técnicos, extensionistas agrícolas, produtores e consumidores.
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Conflito de interesses
Magda Zanoni aponta que havia conflitos de interesses entre os integrantes da CTNBio. ‘Havia pesquisadores cujos laboratórios eram sustentados pelas multinacionais produtoras de transgênicos.’
Conforme a pesquisadora, o livro é dividido em três partes. A primeira faz a crítica ao que ela chama de ‘reducionismo cientifíco’.
‘Os artigos demonstram esse dogma central, de que um gene corresponde a uma proteína e a uma função, segundo o qual haveria controle total, sem riscos. Há [sobre os transgênicos] várias questões sem resposta.’
As duas outras partes da obra abordam a necessidade do enfoque multidisciplinar e da participação social nas discussões sobre o tema.
‘Tentamos reunir todo nosso conhecimento científico e popular em forma de livro, que nasceu da necessidade de um cotidiano sofrido [na CTNBio]’, explica Magda. ‘O apoio dos movimentos sociais nos permitiu continuar lá dentro.’
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Público x Privado
O professor Victor Pelaez, do Departamento de Economia da UFPR, observou que a criação da CTNBio acabou por esvaziar órgãos como o Ibama e a Anvisa, dando à comissão um poder ‘inconstitucional’.
Desde junho de 2005 tramita no Supremo Tribunal Federal uma ação que questiona a constitucionalidade das atribuições conferidas à CTNBio.
‘Uma estratégia típica das empresas é traduzir os seus interesses privados em interesses públicos’, disse Pelaez. ‘Esse processo perverso é inerente ao capitalismo e contamina a agenda política.’
O professor de Economia citou uma publicação da Academia Nacional de Ciências dos EUA, segundo a qual dizer apenas que ‘não há evidências’ de riscos relacionados aos transgênicos pode significar que faltam estudos e monitoramento a longo prazo.
‘A pressa para se aprovar a Lei de Biossegurança seguiu a lógica do mercado, para atender investimentos milionários de multinacionais como a Monsanto’, disparou Pelaez.
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPR, José Antonio Peres Gediel, afirmou que o tema dos transgênicos parece ter saído do foco da mídia brasileira. ‘É papel da universidade manter essa postura crítica em relação aos riscos.’
‘As transnacionais têm pautado a nossa formação e dominado o mercado de produção de alimentos’, disse o estudante Felipe Teixeira, da Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (Feab).
Larissa Packer, advogada da ONG Terra de Direitos, criticou o fato de o Brasil ter assinado em 1994 um acordo de propriedade intelectual na OMC (Organização Mundial de Comércio). ‘Países foram compelidos a assinar um acordo que autorizou a apropriação privada sobre formas de vida.’
Com 21,4 milhões de hectares cultivados, o Brasil é o segundo maior produtor de transgênicos do mundo, atrás apenas dos EUA. Dos 28 tipos de sementes transgênicas liberadas até hoje no país, 21 são resistentes ao herbicida Roundup, produzido pela multinacional Monsanto.
Em todo o mundo, apenas seis conglomerados dominam o setor de sementes transgênicas.
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Sobre a CTNBio
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, tem a finalidade de prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao governo federal sobre a Política Nacional de Biossegurança relativa aos OGMs (organismos geneticamente modificados).
Também cabe à CTNBio estabelecer normas técnicas de segurança e pareceres técnicos conclusivos referentes à proteção da saúde humana, dos organismos vivos e do meio ambiente no que se refere aos transgênicos.
O funcionamento da CTNBio é definido pela Lei de Biossegurança (lei federal 11.105), regulamentada em 2005.
Sobre os organizadores
Magda Zanoni é bióloga e socióloga, professora da Universidade de Paris Diderot, onde foi pesquisadora de 1978 a 1990 no Laboratoire d’Ecologie Génerale et Appliquée; tem mestrado em Ecologia Fundamental pela Universidade de Paris-Orsay e em Ciências Sociais do Desenvolvimento pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (Paris); é doutora em Sociologia do Desenvolvimento pela Universidade de Paris I-Sorbonne. Atuou no Instituto Agronômico do Paraná e Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social do Paraná, e esteve cedida ao NEAD/MDA pelo Ministério francês do Ensino Superior e da Pesquisa no período de 2003-2009. Atualmente, e desde 1998, é pesquisadora do laboratório “Dynamiques Sociales et Recomposition des Espaces” (Centro Nacional de Pesquisa Científica CNRS, França).
Gilles Ferment é mestre em Ecologia e Gestão Ambiental, com graduação e pós-graduação em Biologia dos Organismos Animais e Vegetais. Formado na Universidade Paris-Diderot, atuou durante três anos como pesquisador em Biossegurança, sobre os riscos das plantas transgênicas para o meio ambiente, a saúde humana e animal, no NEAD/MDA.
Ficha técnica
‘Transgênicos para quem? Agricultura, Ciência e Sociedade’
Série NEAD Debate
536 páginas
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Fonte: Fernando César Oliveira
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