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Processo que transforma sobras de amianto branco em fertilizante é tema de doutorado na UFPR

Uma tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Química (PPGQ), em fevereiro, propõe um processo que promove o reúso do amianto por meio da transformação do mineral em fertilizante. O estudo do químico Roger Borges partiu da composição do amianto branco (crisotila) — que contém magnésio e silício, aproveitados pelas plantas — para obter um novo composto, resultante da mistura mecânica do mineral com um fertilizante solúvel. A pesquisa indica que o composto obtido com a mistura funciona como fertilizante de longa duração e, possivelmente, como corretor para solos muito ácidos.

Para isso, o estudo sugere que produtos de amianto podem ser misturados ao fertilizante solúvel com o uso de uma máquina chamada de moinho de bolas (ou esferas) de alta energia. A mistura pode ser feita com o amianto puro ou com materiais à base de amianto — caso da telha de fibrocimento, composta por cerca de 10% do mineral. “Pelo processo, conseguimos destruir a estrutura do amianto, rompendo completamente as fibras dele e, com isso, formando um novo material, que não tem a periculosidade do amianto”, diz Borges.

Tempos do processo: telha de amianto; fibras do amianto crisotila; fertilizante solúvel usado na mistura; e fertilizante que resulta da transformação. Fotos: Stefano Mortellaro/Divulgação; Reprodução; Reprodução/Wikimedia Commons; e Acervo Pessoal

O pesquisador se refere à classificação tóxica do amianto (também chamado de asbesto), cujas fibras causam danos graves à saúde de trabalhadores da sua indústria. Por conta disso, a extração e a transformação do asbesto foram restringidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano passado, depois de 13 anos de discussão. “O Brasil aboliu essa indústria tarde, então há muito material no mercado e será preciso dar novo uso a ele”, lembra Borges.

Atualmente, existem cerca de 3 mil produtos à base de amianto, em geral, fibrocimentos usados na construção civil, de acordo com o Observatório do Amianto. O principal desafio para o descarte desse material é sua resistência — justamente o motivo de a indústria do amianto ter se desenvolvido no mundo. “O amianto é um mineral altamente resistente à desintegração, seja por temperaturas, abrasão ou quaisquer outros processos”, explica Fernando Wypych, professor do PPQG na linha de química de materiais.

Análise

Para verificar em que ponto do processo mecânico proposto as fibras do amianto são destruídas, Borges usou principalmente duas formas de análise. Uma delas é a difratometria de raios X, uma técnica que verifica as fases (aspectos) dos compostos químicos. A segunda técnica é a microscopia eletrônica de varredura, que permite visualizar a estrutura de compostos.

No dia da banca: Alexandre A. Leitão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Roger Borges; Vanessa Prévot, da Université Blaise Pascal; Fernando Wypych, orientador; e Shirley Nakagaki, do Departamento de Química da UFPR. Também participaram da banca os professores Christian Ruby, do Laboratoire de Chimie Physique et Microbiologie pour l’Environnement; Herbert Winnischofer, da UFPR; e Claude Forano, do Institut de Chimie de Clermont-Ferrand. Foto: Acervo Pessoal

Assim, constatou-se que, no processo, as fibras do asbesto (formadas por nanotubos de crisotila) são transformadas em pó. A proporção ideal dos materiais da mistura e o tempo de moagem estão desde 2016 em processo de patenteamento pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).

O pesquisador destaca que o processo se apresenta como uma alternativa mais barata aos tratamentos disponíveis para descarte do amianto. Atualmente o mineral precisa ser descartado em aterros industriais ou decomposto termicamente, em um processo chamado de calcinação. Nele, o material é submetido a uma temperatura de 850 graus, durante duas horas, em um forno específico, para que se quebrem as fibras do asbesto.

Outra vantagem é que todos os componentes químicos que resultam da mistura podem ser usados como fertilizante. É o contrário do que ocorre na calcinação, em que são produzidos dois resíduos (óxido de magnésio e óxido de silício) pouco usados pela indústria.

Fertilizante

A pesquisa indica ainda que a mistura ao amianto contribui para que o fertilizante solúvel se torne mais eficiente e menos poluente. Isso ocorre porque, de acordo com os testes, o amianto reduz a solubilidade do fertilizante.

O fato de ser solúvel é o que faz do fertilizante (no caso, o monohidrógeno fostato de potássio) um insumo pouco resistente a chuvas e com tendência a escoar para lençóis freáticos e demais corpos de água. Já os fertilizantes de longa duração mantém os nutrientes no solo por mais tempo. “A princípio, nos testes controlados, verificamos que o fertilizante que é criado pode ser usado em qualquer tipo de cultura”, afirma Borges.