Logo UFPR

UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARANÁ

Agência de Inovação da UFPR prepara licenciamento de fertilizante

A tecnologia promete vantagens em relação aos já existentes, especialmente no que se refere ao período em que fica no solo: fertilizantes convencionais são levados pela água, o que aumenta o custo de produção. Pelo fato de usar um polímero biodegradável, o fertilizante desenvolvido na UFPR causa também menor impacto ambiental em relação aos convencionais.

Sete empresas, que a Agência de Inovação não identifica, já se interessaram por licenciar a tecnologia. Como manda a Lei de Inovação federal, o processo de licenciamento de uma tecnologia deve ser feito mediante edital, para garantir o direito de concorrência. O edital deve ser publicado pela UFPR até o final de agosto e o licenciamento será exclusivo, ou seja, apenas uma empresa poderá usar a tecnologia.

Das sete empresas interessadas, três ficaram sabendo da tecnologia ao participar do III Encontro do Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (III Fortec), realizado na Unicamp, em Campinas, entre os dias 27 e 29 de abril deste ano. Durante o encontro, que reuniu gestores de diversos núcleos e agências de inovação de universidades e institutos de pesquisa, e empresários, houve uma mostra de tecnologias, e uma das apresentadas ao público foi justamente o fertilizante, resultado das pesquisas de Antonio Mangrich e Fernando Wypych, professores do Instituto de Química da UFPR.

O estado da tecnologia – A tecnologia ainda não foi testada em escala piloto. A empresa que vencer a licitação deverá se comprometer com o investimento necessário para a continuação do desenvolvimento do fertilizante. O valor do investimento estará explícito no edital. Os pesquisadores e a UFPR depositaram o pedido de patente do fertilizante no Brasil em 8 de agosto de 2007. A titularidade da patente é da universidade. Os pesquisadores, como manda a Lei de Inovação, têm direito a parte dos royalties pela invenção.

Esse deve ser o primeiro licenciamento da agência de inovação da UFPR, conta Eduardo Scopel Ferreira da Costa, analista de propriedade intelectual do órgão. A agência foi criada em 2007 e opera desde o ano passado. ‘Existe o instrumento, mas estamos na fase de capacitar os órgãos de controle sobre como ele funciona’, explica Costa. Ele se refere ao fato de a Procuradoria Geral da União, o Tribunal de Contas da União e outros órgãos de controle entenderem que a relação entre o setor público e privado deve passar pela Lei de Licitações (lei 8.666). A lei privilegia o critério de preço em detrimento de outras características, como a capacidade de investimento da empresa interessada em licenciar a tecnologia, por exemplo.

O ‘sanduíche’- Os fertilizantes são compostos químicos aplicados ao solo para corrigir eventuais deficiências de nutrientes para as plantas. Um dos mais comuns é o fertilizante à base de nitrogênio. Contudo, esse produto adere pouco aos componentes do solo, e assim se perde rapidamente por lixiviação, o processo de ‘lavagem’ do solo pela água, especialmente a das chuvas. Além de ficar pouco tempo no solo, ainda é carregado pelas águas pluviais para córregos, rios e lagos, o que causa poluição. Diante desses problemas, os pesquisadores começaram a pensar em uma tecnologia que pudesse gerar um fertilizante granulado, de aplicação direta no solo, e que promovesse uma liberação lenta e gradual do nitrogênio.
Mangrich e Wypych trabalharam, então, em um processo de intercalação de ureia (composto rico em nitrogênio) em argilas da família caulim e também em um processo para dispersar a ureia em polímeros biodegradáveis. Os pesquisadores explicaram a Inovação que fizeram um ‘sanduíche’. Eles partiram do caulim, constituído de um alumino silicato hidratado, que seria o equivalente ao pão de forma do sanduíche; a ureia equivaleria ao recheio do sanduíche. Formaram assim o composto de intercalação. ‘Se jogarmos esse material no solo, será difícil para a ureia sair de dentro da estrutura do caulim, como quando se tenta retirar uma fatia de queijo de dentro das duas fatias de pão. Isso transforma o material em um liberador lento de nitrogênio’, explica Wypych.

E como entra o polímero nessa história? ‘Uma possibilidade de retardar ainda mais o processo de liberação é usar o recurso do recobrir o material com um polímero, que forma grânulos’, responde o pesquisador. Quando os grânulos sofrem ataques no solo ― ataque químico, físico ou de um microorganismo ― o composto de intercalação é exposto e ocorre a liberação da ureia. ‘Esse é o segredo desses compostos’, acrescenta
Polímero é comida para os microorganismos

O polímero pode ser de origem vegetal ― de amido de mandioca, batata ou milho ou de resíduos de sua produção. Esses resíduos de amido podem ser plastificados pela adição de um álcool chamado poliol e transformados em uma espécie de borracha que ‘os microorganismo adoram’, como diz Wypych. Os pesquisadores depositaram dois pedidos de patentes referentes à obtenção de polímero a partir de resíduos.

‘Esse polímero vira comida dos microorganismos ou é hidrolisado pelas intempéries [química ou física ou ambas]. Dessa forma, o composto é liberado e as plantas podem então utilizar a ureia’, prossegue Wypych. Depois que os microorganismos agem e a ureia é liberada, o que resta desse processo é o caulim, um constituinte do solo, daí não ter nenhum impacto ambiente. ‘Todos os solos brasileiros têm caulim em maiores ou menores proporções. O caulim é benéfico para o solo por sequestrar espécies químicas de interesse ambiental amplamente utilizadas na agricultura como os pesticidas, fungicidas, etc.’, afirma ele.

Os cientistas ainda não sabem quanto tempo a mais esse fertilizante fica no solo em relação aos que já existem. ‘Não fizemos experimentos em solo, somente em laboratório. Sabemos que, dependendo dessa camada, os tempos podem ser controlados da forma que se deseje’, adianta o pesquisador. ‘Mesmo no composto sem polímero o tempo varia entre dezenas e centenas de horas, enquanto em uma aplicação direta de ureia no solo as perdas podem chegar a até 40%-70% em poucas horas. Mas isso obviamente depende das condições de tempo e clima, de fatores como insolação, umidade do solo e incidência de chuvas, entre outros’, comenta.

Parceiros para testes de campo- Os testes de campo, no solo, são justamente a etapa que falta para completar o desenvolvimento da tecnologia. ‘Não temos competência para realizar esses testes em campo, precisamos de parcerias com instituições especializadas, as quais podem, ou não, avalizar nossos testes’, justifica Wypych. Com o licenciamento, a UFPR espera conseguir uma empresa que faça os experimentos de campo, de forma a acompanhar a liberação de nitrogênio e a absorção pelas plantas e que possa cruzar essas informações com o produto comercial. ‘Nós nos dispomos a fornecer o conhecimento para a produção de algumas centenas de quilogramas. O material pode ser preparado de forma muito simples, basta ter equipamentos básicos para isso e que comportem o volume desejado’, acrescenta.

Mesmo sem esses testes, os pesquisadores sabem que é possível usar o fertilizante para qualquer tipo de cultura, pois o nitrogênio é um elemento essencial para o desenvolvimento de todas as plantas. Esse fertilizante se apresenta na forma de pó fino, mas pode ser granulado ou encapsulado, dependendo da vontade do consumidor. A única forma na qual ele não pode ser utilizado é a líquida, já que resulta da combinação e intercalação de sólidos e forma um composto insolúvel em qualquer solvente.

As vantagens do fertilizante

Além da maior permanência no solo e da liberação controlada, o menor impacto no meio ambiente é outra vantagem dessa tecnologia. A possibilidade de controlar a liberação de nitrogênio, além de representar economia para os produtores rurais, resulta em diminuição no impacto ambiental que pode ocorrer em virtude do excesso de nitrogênio no solo e nas águas. Um dos danos provocados é a eutrofização de rios, lagos, etc., ou seja, a excessiva proliferação de algas.

Essas algas entram em decomposição, o que aumenta o número de microorganismos e deteriora a qualidade da água. Essa proliferação é causada pelo excesso de compostos químicos ricos em fósforo ou nitrogênio, resultado da descarga de efluentes agrícolas, urbanos ou industriais em um corpo de água fechado como uma lagoa.

Como vantagens econômicas adicionais, Wypych lembra que a ureia utilizada para fins de aplicação como fertilizante precisa se apresentar de forma granulada, mais cara que a ureia em pó. ‘Nosso processo deve usar ureia em pó, o que já é um fator simplificador’, aponta. O Brasil é o segundo maior produtor mundial do minério caulim, a matriz do fertilizante. ‘Essa tecnologia pode agregar valor a esse material, que é muito barato’, ressalta. O uso do fertilizante também não gera subprodutos indesejados, pois o caulim, não absorvido pelas plantas, é constituinte do solo. O pesquisador também garante que o material é produzido de forma simples e barata, não havendo necessidade de construir ou comprar equipamentos especiais para sua produção.

Além do uso como fertilizante, existem outras aplicações para esse composto que, no momento, não podem ser divulgadas, por causa do sigilo de patente. ‘Podemos adiantar que essas aplicações talvez sejam ainda melhores do que no caso do fertilizante de liberação lenta de nitrogênio’, comemora o pesquisador.

Para a realização da pesquisa, os pesquisadores contaram com recursos para bolsas de pesquisa para alunos da pós-graduação, compra de equipamentos pelo departamento e a bolsa de pesquisador aos orientadores. As verbas vieram de órgãos de fomento como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Quanto foi investido na pesquisa? ‘Os únicos investimentos diretos feitos foram suor, tempo e paciência’, responde Wypych.

Foto(s) relacionada(s):


professor Fernando Wypych
Foto: divulgação


professor Antonio Mangrich
Foto: divulgação

Fonte: reprodução do jornal on line da UNICAMP