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“Por que acontecem tantas enchentes no Brasil?”: cientistas da UFPR respondem dúvidas sobre desastres naturais

Confira perguntas da sociedade sobre prevenção, gestão de riscos, enchentes, terremotos e queimadas e respostas de cientistas da Universidade

Em meio a um cenário mundial de desastres naturais, talvez você já deva ter se questionado do por que isso tudo tem acontecido. Você já se perguntou por que tem acontecido tantas enchentes no Brasil? Ou quando a gente vai poder prever terremotos? Ou até se muitas catástrofes poderiam ser evitadas caso não houvesse tanta concentração populacional?

Essas são algumas das perguntas enviadas pela população que foram respondidas pelos cientistas Renato Eugenio de Lima, diretor do Centro de Apoio Científico em Desastres (Cenacid UFPR) e professor do Departamento de Geologia da UFPR; e Paulo De Tarso De Lara Pires, pós-doutor em Direito Ambiental e Desastres Naturais na Universidade de Berkeley e professor do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

A seleção de perguntas e respostas sobre desastres naturais faz parte da iniciativa Pergunte aos Cientistas, da Agência Escola UFPR, que tem como objetivo aproximar cada vez mais a sociedade dos cientistas e da ciência produzida na Universidade Federal do Paraná. Durante a pandemia de coronavírus, as edições da ação foram responsáveis por responder mais de 300 questões da população acerca do tema. Agora, outras temáticas estão sendo abordadas. Confira as perguntas e respostas e aprenda mais sobre esse tema:

“É verdade que muitas catástrofes poderiam ser evitadas se não houvesse tanta concentração populacional em certos lugares?” (Rafaella Ferraro, 22 anos, Designer, Curitiba-PR)
Paulo De Tarso De Lara Pires, cientista UFPR – O aumento da densidade populacional nos centros urbanos pode levar ao aumento do risco de desastres naturais, especialmente quando a urbanização é rápida, mal planejada e, principalmente, quando ocorre em um contexto de desigualdade social. Dados divulgados pela ONU (Organização das Nações Unidas) apontam que cerca de 70% das pessoas em áreas urbanas de países de baixa renda vivem em moradias inseguras e expostas a riscos. As parcelas mais pobres da população são particularmente vulneráveis às mudanças climáticas e aos riscos naturais devido à sua localização dentro das cidades e à falta de serviços básicos. Infelizmente, o crescimento descontrolado das grandes metrópoles impulsiona a vulnerabilidade, considerando que o risco de desastres raramente é levado em conta nas decisões de investimento.
A carência de políticas sérias de desenvolvimento urbano, a falta de aplicação dos códigos de construção, associadas à inércia seletiva da fiscalização, frequentemente ligada à corrupção e especulação imobiliária, contribuem para transferência de risco das empresas de construção para aqueles que vivem e trabalham nos edifícios. Os grupos mais vulneráveis, marginalizados, tendem então a se estabelecer e construir suas casas em locais inseguros e que não dispõem de infraestrutura e serviços públicos adequados.
Por outro lado, Castilho Barone (2019), professora e pesquisadora da USP (Universidade de São Paulo), aponta o adensamento populacional em centros urbanos como uma das soluções para diminuir a pressão sobre os recursos naturais e a exposição da população ao risco, desde que feito de forma ordenada, com melhor aproveitamento de áreas já urbanizadas e otimização do uso de imóveis e terrenos desocupados.
O crescimento populacional desordenado, em espaços urbanos mal planejados, num contexto de desigualdade social e econômica, cria um cenário propício para a severa mortalidade ocasionada por eventos naturais catastróficos.

“Como mudar esse olhar do gestor público para gestão de risco? Creio que esse paradigma ainda não houve mudança. Diante de tantos eventos adversos, depois de 2008, teve um outro olhar, mas sempre ficamos na resposta e nunca na prevenção de como podemos mudar.” (Márnio Luiz Pereira, 54 anos, agente de Defesa Civil, Joinville-SC)
Paulo De Tarso De Lara Pires, cientista UFPR – No Brasil, assim como em tantos outros países pouco desenvolvidos do ponto de vista dos direitos humanos, o Poder Público insiste em agir de forma reativa e não proativa quando trata de questões relacionadas à gestão de risco. Todos os anos cerca de 60 mil vidas são ceifadas globalmente em consequência de eventos catastróficos. As perdas econômicas causadas por desastres naturais no Brasil em 2020 chegaram a US$ 3,66 bilhões. O gestor público, no entanto, só será realmente sensibilizado quando houver uma mudança no olhar da população em relação à situação atual.
Uma das questões que devem ser consideradas é que, como as populações atingidas por enchentes e deslizamentos de terra são na sua maioria as mais pobres, a pressão sobre os governantes é menor quando comparado com um evento que atinge camadas da sociedade mais abastadas. Maior poderio econômico, maior a pressão!
Mas esse quadro vem mudando à medida que os desastres naturais ganham escala e os custos com a recuperação de infraestrutura e com o pagamento de indenização por parte das seguradoras nas áreas afetadas crescem de forma exponencial. Assim, as grandes corporações de seguro, que pertencem a grandes conglomerados financeiros, começam a contabilizar os prejuízos e consequentemente buscam alternativas para solucionar ou minimizar os impactos. Essa solução, invariavelmente, passa pelos gestores públicos, que em grande monta ainda dependem do auxilio econômico destes conglomerados para alavancar suas campanhas eleitorais. Esse é um processo que vem acontecendo no mundo todo e tem transformado não tão somente o olhar do gestor público, mas também impulsionado pesquisas sobre o tema nas universidades e em outras instituições de pesquisa, que são parte importante na busca de instrumentos técnicos, legais e políticos para a mitigação dos impactos dos desastres naturais.

“Por que ultimamente tem acontecido tantas enchentes no Brasil?” (Mônica Schreiber, 25 anos, bailarina, Curitiba-PR)
Renato Eugenio de Lima, cientista UFPR – Existem três razões principais. A primeira é a super ocupação dos terrenos. Nós estamos impermeabilizando os terrenos com telhados, com asfaltos, com calçadas. A água que não vai para lençol subterrâneo vai para o rio. A consequência disso são mais inundações.
A segunda razão são as interferências que fazemos nos canais dos rios. Nós estamos canalizando, retificando, pondo barramentos, lançando objetos nos rios e isso se volta em um desequilíbrio do sistema do rio, gerando enchentes e inundações mais frequentes.
O terceiro motivo são os extremos do clima. Os estudos da ONU (Organização das Nações Unidas) apontam que eles estão mais agudos, mais intensos, de maior magnitude. Quando nós temos hoje uma chuva forte, ela é maior que uma chuva forte no passado.
Uma razão acessória para nossa percepção de mais inundações é a comunicação. Hoje ela é mais rápida, mais intensa e mais frequente. E talvez isso gere uma percepção que estão ocorrendo um número muito maior de enchentes e inundações sobre o terreno.

Clique aqui e assista a um vídeo sobre a edição Desastres Naturais do Pergunte aos Cientistas, uma produção da Agência Escola UFPR.

“Apesar da evolução tecnológica caminhar a passos largos, ainda não é possível prever eventos sismológicos. O quão distante estamos de podermos prever terremotos?” (Edward Massayuki Uyetaqui, 52 anos, portuário, Paranaguá-PR)
Renato Eugenio de Lima, cientista UFPR – Esta é uma pergunta que ninguém tem condições de responder completamente neste momento. Terremotos são processos causados pela movimentação ao longo de grandes falhas geológicas, que liberam energia acumulada nas rochas por longos períodos de tempo. Em diversos países do mundo, estão sendo desenvolvidos importantes estudos buscando compreender melhor a dinâmica envolvida nas atividades sísmicas relacionadas a processos geotectônicos (ligados à movimentação das placas tectônicas globais, diferentes partes da crosta terrestre).
Importantes avanços têm sido registrados em relação a conhecer a frequência com que ocorrem grandes terremotos. Outro aspecto muito importante é que temos cada vez avançado em termos de preparação e redução de danos, inclusive com extraordinária capacidade de edificar construções sismo-resistentes (resistentes a terremotos). Também já possuímos sistemas globais de alertas de tsunamis, que são os maremotos (ondas gigantes devastadoras) muitas vezes causados por terremotos no fundo oceânico.
Alguns cientistas propuseram e realizaram estudos com métodos hipotéticos para previsão de terremotos, mas ainda não há nenhum método confiável reconhecido pela comunidade científica. Hoje é possível antecipar quais áreas estão mais sujeitas a atividade sísmica, ou seja, podemos prever quais áreas serão mais provavelmente afetadas por terremotos. Mas, apesar dos grandes avanços, ainda é necessária muita pesquisa para podermos prever terremotos com exatidão temporal.

“Como se dá o processo das queimadas quando ocorrem altas temperaturas (como no ano passado aconteceu no Canadá com temperaturas de 50°C)?” (Mônica Schreiber, 25 anos, bailarina, Curitiba-PR)
Paulo De Tarso De Lara Pires, cientista UFPR – Nos últimos anos as florestas da região oeste do Canadá e Estados Unidos têm sido dizimadas por graves incêndios florestais, que acabam por se alastrar por comunidades rurais e áreas urbanas. Por certo, as mudanças climáticas e os aumentos de temperatura global têm contribuído para estes desastres. Porém, o risco de incêndio depende de um conjunto de fatores, incluindo temperatura, umidade do solo, topografia e a presença de árvores, arbustos e outros combustíveis potenciais. Na América do Norte muitas florestas nacionais estão mal manejadas, com alta densidade populacional, com sérios problemas fitossanitários e carecendo de boas práticas silviculturais (intervenções para aumentar qualidade e produtividade da floresta), como desbaste seletivo, para manter a sanidade das árvores. Altas temperaturas associadas a florestas mal manejadas criam o cenário perfeito para catastróficas queimadas. Folhas, galhos caídos, serapilheira e outros materiais não processados podem gerar combustão espontânea por causa do calor produzido pela fermentação bacteriana. Adicionalmente, descargas elétricas (raios) ou a ação humana (queima descontrolada, faíscas de veículos automotores) podem ser também o estopim para uma catástrofe, uma pequena parte dentro deste complexo sistema.
É importante lembrar que o poder público, a sociedade, os construtores, proprietários de casas e gestores florestais podem reduzir a probabilidade e os impactos dos incêndios florestais através de algumas medidas, como:
– Evitar empreendimentos (especialmente residenciais) próximos a florestas propensas a incêndios através de regras de zoneamento inteligente.
– Incorporar características e materiais de projeto resistentes ao fogo em edifícios.
– Aumentar os recursos destinados ao combate e prevenção de incêndios.
– Remover combustíveis, como árvores mortas, das florestas que estão em risco.
– Desenvolver planos de recuperação antes de um incêndio e implementar planos rapidamente após um incêndio para reduzir a erosão, limitar a inundação e minimizar os danos ao habitat.
São pequenas atitudes que podem fazer uma grande diferença.

Créditos:
Foto de destaque: Sérgio Vale/Agência de Notícias do Acre. Diagramação da imagem: Letícia Terumi Uyetaqui/Agência Escola UFPR
Identidade visual Pergunte aos Cientistas: Gabriela Tacla e Leticia Terumi Uyetaqui/Agência Escola UFPR
Ilustração e desenvolvimento de ícones: Ana Polena/Agência Escola UFPR

Por Chananda Lipszyc Buss
Sob supervisão de Chirlei Kohls
Parceria Superintendência de Comunicação e Marketing (Sucom) e Agência Escola de Comunicação Pública da UFPR

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